Pagar pelas quinas ao peito?
Pagar do 'próprio bolso' para ir a competições internacionais é uma realidade no Hóquei em Patins de outras federações. Mas a federação portuguesa abre um precedente com outra disciplina, a Patinagem Artística, para a Taça da Europa...
É um cenário difícil de imaginar no Hóquei em Patins, mas a Federação de Patinagem de Portugal abre com a Patinagem Artística um precedente que, num tratamento de igualdade entre as suas disciplinas, o obriga a considerar.
Na convocatória para os centros de treino para as Taça da Europa das Seleções Nacionais de Patinagem Artística, nas especialidades de Patinagem Livre e Solo Dance e Pares de Dança, a federação surpreendeu o mundo da Artística com uma nota de rodapé. "Com o alargamento do número de participações nas Competições Internacionais, Campeonato da Europa e das Taças da Europa de Dança e Patinagem Livre, vem esta Federação informar que irá suportar todos os custos referentes aos escalões de Infantis, Iniciados e Cadetes na Taça da Europa de Dança e Patinagem Livre. Para os restantes escalões, Juvenis, Juniores e Seniores, será divulgada em breve uma listagem dos atletas referenciados para participar nas competições, que por sua vez deverão confirmar a sua participação assumindo todos os custos decorrentes da mesma.", pode ler-se.
Ou seja, Juvenis, Juniores e Seniores pagariam a participação nas provas (ambas em Outubro, de Patinagem Livre em sede a anunciar e de Dança nos Países Baixos) do seu próprio bolso.
O Hóquei em Patins terá Campeonato da Europa de Sub-17 ("Juvenis") em Setembro, na Catalunha. Não sendo expectável, poderia ser surpreendido com uma "nota de rodapé"?
De facto, as Taça da Europa de Juniores e Seniores não estão previstas no Plano de Actividades e Orçamento para 2022, sendo apenas referenciados os escalões de Infantis a Juvenis, mas estes últimos também são excluídos do suporte financeiro federativo.
Frise-se que, pese o maior impacto mediático do Hóquei em Patins, a Patinagem Artística é a disciplina que - regularmente, como, por exemplo, nos últimos quatro anos/temporadas - tem contribuído com mais atletas para os números federativos.
Indignação e ameaça em carta aberta
Surpreendida pela nota de rodapé nas convocatórias, a Associação de Treinadores de Patinagem Artística (ATPA) reagiu numa carta aberta dirigida a Luís Sénica, presidente da Federação de Patinagem de Portugal. Se no Hóquei em Patins há muito ruído, mas não mais do que ameaças vãs pouco fundamentadas, a Patinagem Artística toma uma posição bem alicerçada.
Remetendo para o Regime Jurídico das Federações Desportivas, para o estatuto de utilidade pública e os apoios do estatal IPDJ, a ATPA aponta desde logo como falhas graves as alterações regulamentares para épocas em curso e a referência a um Regulamento de Selecções Nacionais (RSN) que não está disponível no site federativo.
"Informamos que na falta de resposta de V. Exa. iremos formalizar a devida denúncia ao órgão fiscalizador da Administração Pública para agir em conformidade com a Lei", lê-se na carta aberta que refere "factos (...) que consubstanciam indícios de prática de ilegalidades ou irregularidades graves, por ação ou omissão, da FPP".
A responsabilidade financeira da FPP
Alguns dos factos citados pela ATPA são recorrentemente alvo de denúncia pública, mas vão sendo tratados com indiferença pelos diversos agentes do Hóquei em Patins.
Por exemplo, o Regulamento Geral de Hóquei em Patins (RGHP) só devia produzir efeitos na época seguinte, mas ainda na pretérita temporada foi "atropelado" no modelo competitivo dos escalões jovens, reformulado com a época em curso. Já este ano, o RGHP, aprovado - segundo o mesmo - a 20 de Julho em reunião de Direcção, teve revisão de conteúdo a 17 de Agosto (já com a época desportiva, que começa a 1 de Agosto, em curso) sem que tenha sido dada nota de qualquer aprovação ou da disponibilização de nova versão.
Também o RGHP remete para o "desaparecido" RSN. A última versão que esteve disponível, aprovado em Assembleia-Geral Extraordinária em Abril de 2006 e posteriormente alterado em reunião de Direção em Outubro de 2014, estabelecia, por exemplo, que o estatuto de "seleccionável" não era atribuído a atletas que, com nacionalidade adquirida, já tivessem representado a selecção do país de origem. Mas define também a responsabilidade financeira da FPP.
No artigo 4º do RSN, pode (ou podia...) ler-se no ponto 1 que "relativamente a todos os membros que integrem as comitivas das selecções nacionais das diferentes disciplinas da patinagem, a direcção da FPP suportará todos os encargos inerentes ao cumprimento dos respectivos planos e programas de actividades (fases de preparação e competição) (...)", ressalvando no ponto 2 que poderá assumir "ou não o pagamento de outros encargos de natureza financeira", como ajudas de custo ou prémios. Mas nunca que não pagará o previsto no ponto 1...
Segunda-feira, 22 de Agosto de 2022, 14h09