Os dois amores do Necas
Recorte: O JogoEste sábado tem lugar um dos dérbis com mais história no Hóquei em Patins. O Paço de Arcos recebe o Sporting a partir das 18h.
Separados por três pontos na tabela classificativa, Paço de Arcos, actual oitavo, e Sporting, quinto, são históricos da modalidade e contam, entre si, 15 títulos nacionais, com oito para a equipa da Linha e sete para os leões.
No entanto, os oito títulos do Paço de Arcos não são consensuais. Em 1942 e 1944, o título nacional foi conquistado pelo Paço de Arcos Hóquei Clube que, após o segundo título, se fundiu com o Desportivo Académico de Paço de Arcos para dar origem ao Clube Desportivo de Paço de Arcos, que persiste até hoje.
Jesus Correia esteve na fundação dos “dois” emblemas campeões como Paço de Arcos. Foi sócio fundador com o nº 11 do primeiro e nº 7 do que persiste até hoje.
O Paço de Arcos mudou de nome mas não os hábitos de vitória e voltaria a sagrar-se campeão em 1945, 1946, 1947, 1948, 1953 e 1955. Sempre com Jesus Correia na equipa.
António Jesus Correia, carinhosamente tratado como Necas, foi um dos expoentes máximos do hóquei em patins nacional. E, em algo que hoje seria uma utopia, do futebol também. Foi um apaixonado pelo Paço de Arcos, da sua terra natal. E pelo Sporting. Enquanto conquistava títulos no hóquei, dava “música” de leão ao peito no futebol.
Já campeão nacional de patins calçados, Jesus Correia chegou ao Sporting em 1943 e foi logo campeão de chuteiras nos pés. Nos relvados, ganhou um lugar na história como o extremo-direito do mais famoso quinteto de que há memória, e que perdurará como “Os Cinco Violinos”. Jesus Correia, Vasques, Albano, Travassos e Peyroteo jogaram juntos na linha avançada do Sporting entre 1946 e 1949, com o Sporting a conquistar nessas três épocas o título nacional de futebol. Nessas três épocas, Jesus Correia ganhou duas vezes o Campeonato Nacional de Hóquei em Patins…
A série de cinco títulos consecutivos do Paço de Arcos entre 1944 e 1948 só foi igualada entre 1983 e 1987 pelo FC Porto e só foi superada no “deca”, também dos dragões, que culminou em 2011.
Dez temporadas de leão ao peito granjearam-lhe sete títulos nacionais, com um total de 208 jogos e 159 golos apontados. Mas, em 1953, com “apenas” 28 anos e depois de conquistar um segundo tricampeonato pelo Sporting, Jesus Correia foi obrigado a escolher. Escolheu o Hóquei em Patins e o Paço de Arcos ganharia o seu oitavo – e último até ao momento – título nacional em 1955.
Para além de Paço de Arcos e Sporting, Jesus Correia distinguiu-se também de quinas ao peito. Pela selecção portuguesa de futebol, modesta e longe de pensar nas grandes competições, somou 13 internacionalizações e três golos. Pela selecção portuguesa de hóquei, subiu ao Olimpo.
Com 132 internacionalizações e duas centenas de golos apontados, conquistou o primeiro título Mundial – e Europeu, porque na época a prova “valia” os dois títulos – para Portugal em 1947. Em Lisboa e ao lado dos companheiros de sempre, o primo Correia dos Santos e o guarda-redes Emídio Pinto.
“Necas” ganhou também em 1948, 1949 e 1950 naquele que foi o primeiro tetra da história da modalidade. Voltou a ganhar em 1952 e 1956. Foi seleccionador nacional de hóquei em patins entre 1963 e 1966 e somou mais dois títulos europeus, então já independentes do Mundial, em 1963 e 1965.
O Sporting conquistara o primeiro título de campeão nacional em 1939, na edição inaugural, antes de Jesus Correia elevar o Paço de Arcos. E os leões só voltariam a conquistar o campeonato em 1975, já com outras figuras lendárias da modalidade…
No futebol, o Sporting tinha um título quando Jesus Correia chegou. E oito quando optou pelo hóquei. Entre os seus dois amores, como um pai que não quer favorecer nenhum dos filhos, deixaria também o Paço de Arcos com oito títulos nacionais inscritos no seu palmarés.
Sem herdeiros nos dias de hoje...
Jesus Correia não tem nenhum herdeiro à altura. Não é desprimor para os atletas contemporâneos… ainda que numa época em que as exigências eram diferentes, Jesus Correia foi sobrenatural. Hoje, a dita “alta competição” não se compadece com “dois amores”. Reclama monogamia, uma dedicada exclusividade.
Entre os actuais planteis de Paço de Arcos e Sporting, há três atletas que já vestiram as duas camisolas mas sempre no hóquei em patins. Diogo Alves e Miguel Dantas, que este sábado defendem o emblema da Linha, e André Centeno, que jogará de leão ao peito.
Sábado, 23 de Janeiro de 2016, 2h32