Os jovens como base para o futuro (I)
#OPINI1 Conheci o Luís Querido, já em Portugal depois da experiência que teve em Barcelona. Lembro-me de ter reparado nos hábitos, regras e exigência que impunha a si próprio e tentava incutir nos colegas. Luís Querido foi treinado pelo Edu Castro e pelo seu senso crítico apurado. A formação e o percurso de um atleta até chegar aos seniores não depende apenas da sua qualidade, trabalho e talento. Depende também da cultura e da visão das pessoas que gerem um clube.
O Barcelona é um colosso reconhecido – e muitas vezes atacado – por recrutar para as suas fileiras os melhores jogadores do hóquei patinado mundial.
Mas a aposta dos blaugrana esgotar-se-á no recrutamento para a equipa principal? De maneira nenhuma e, com o hóquei sob a coordenação de Ricard Muñoz, cada vez menos.
#IMAGE4001 Ricard Muñoz
“É uma aposta pessoal. Não do clube, mas pessoal. O Barça tem sempre de tentar ser competitivo, ao máximo, e é verdade que há muitos jovens que têm boa progressão. É verdade que às vezes tens de apostar entre o jogador da formação ou um consagrado que vai produzir desde logo mas por quem vais pagar o triplo. Pouco a pouco estamos a tentar contar com mais jogadores do hóquei formativo, para que possam ter mais espaço na primeira equipa. É difícil, mas a filosofia é esta”, refere o também treinador principal do Barcelona.
O Barcelona aposta em equipas a partir dos Sub-15, com os jogadores a poderem evoluir até uma equipa B que já participa numa liga bem competitiva. “Joga na Primeira Nacional, a segunda divisão espanhola”, diz Ricard Muñoz. “Somos o único clube que tem uma filial a jogar na segunda divisão, e com uma equipa formada por dois seniores e os restantes em idade júnior”, reitera Eduard Castro, responsável do hóquei formativo blaugrana.
“Temos equipas Sub-20, Sub-17 e Sub-15. Também participamos no campeonato de Sub-23, que começou no ano passado, com uma equipa formada por jogadores Sub-20 e Sub-17”, explica, sendo que Eduard é treinador desta equipa de Sub-23. E, para três escalões, que participam em cinco grandes provas, os quadros nem são vastos. “Temos um total de 28 jogadores para todas estas categorias e provas. Temos dois jogadores seniores e o resto está em idade formativa”, salienta, numa estrutura que obriga sempre à chamada de jogadores dos escalões abaixo que assim ganham maturidade.
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Para Eduard Castro, a “monopolização” de talentos por parte do Barcelona é um mito. “Vamos então a estatística pura”, desafia. “Comprometemo-nos com uma média de seis, sete jogadores por ano, não mais. E contratamos sempre para os Sub-15, geralmente jogadores ainda Sub-13 ou Sub-15 de primeiro ano, para no ano seguinte continuarem na equipa”, expõe. “Tentamos chegar a acordo com o melhor jogador que haja. Mas muitas vezes não vem o melhor. E, muitas vezes, aqueles com quem falamos acabam por não vir”, constata, partindo para a comparação com outras equipas catalãs. “Comparemos com o Noia, Vic, Sant Cugat, Tordera relativamente aos jogadores que assinam e são dos clubes à volta para formarem equipas bambis, benjamins, infantis… ninguém recruta menos de seis jogadores!”, garante, prosseguindo a sua explicação. “Se um clube de Osona vai buscar um benjamim de outro clube de Osona, é visto como normal. Ou, se se queixam, é só entre os clubes. Se o Barça fizesse o mesmo estaria a ‘destroçar’ o clube de origem”, lamenta. “A prática comum na Catalunha é que os clubes grandes, que têm perto clubes mais pequenos, contratem jogadores o mais jovens possível, pois assim têm a possibilidade de os formar na sua escola durante mais anos”, esclarece. “Nós não recrutamos jovens em iniciação para os formar e torná-los bons jogadores… fazemos exactamente o que faz toda a gente, procuramos já bons jogadores. Mas nós somos o Barça e quando falamos com os jogadores, é mais provável que venham. Chateia porque o jogador que contratamos era bom jogador no seu clube. Mas, e a ilusão do rapaz? Essa não dá para valorizar. Da mesma maneira que um jogador de Torrelavid vai para Sant Sadurní jogar, nós não temos de nos justificar, temos é de desmistificar o tema”, aponta.
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Inclusivamente, o coordenador do hóquei formativo revela que o Barcelona tentou formar uma escola de patinagem. “Tentámos no ano passado mas não funcionou porque naquela zona o hóquei não estava suficientemente enraizado”, confidencia. “A zona em que lançámos o projecto é aqui em Barcelona, em Mundet. É onde jogam os escalões de formação porque não há pista em “La Masía” - mas haverá - mas é uma zona de subúrbios e o projecto acabou por não pegar. Vimos a necessidade de ter uma escola para crianças mais pequenas mas nos outros desportos também não há equipas mais jovens. No entanto, não acho de todo que seja justo dizer que ‘desfazemos’ equipas”, vinca.
E como é que o Barcelona escolhe os seus reforços? “Temos uma rede de espiões por todo o mundo”, graceja Edu Castro. Mais a sério, explica. “Temos informadores na Argentina, em Portugal, Itália… se há algum jogador que se destaca, dizem-nos. Vamos a campeonatos estrangeiros de clubes, ainda que sejam particulares, para ver jogadores. Ou temos as nossas ligas, catalãs, que nos permitem ver jogadores de Sub-13 e identificar os que observamos mais atentamente depois”, afirma, continuando a desmistificar o Barcelona, ‘devorador’ de jogadores. “Contrariamente ao que se fala, o Barça não contrata muitos jogadores. Contrata-os para um primeiro ano de Sub-15 e depois a estadia no Barça é tão longa que dificilmente contratamos algum jogador em idade juvenil ou júnior”, testemunha.
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Ainda assim, vão seguindo o trajecto de potenciais talentos. “Não precisamos de ter muita informação de jogadores para ganhar, porque não é esse o objectivo. O que queremos é conhecer aqueles jogadores que podem despontar. Mais do que olheiros, temos amigos que fizemos ao longo do tempo e que nos dizem que este ou aquele ‘rapazito’ joga muito bem“, conta.
Terça-feira, 27 de Janeiro de 2015, 22h52