Há Dérbi lisboeta no Bairro
Campo de Ourique já foi um dos epicentros do Hóquei em Patins nacional, com momentos dignos de registo nas décadas de 40, 50 e 60. O ponto alto foi em 1954, com a conquista do Campeonato Nacional, numa equipa onde brilhava José Vaz Guedes, uma das figuras maiores do Hóquei português e mundial.
O CACO, como é conhecido o Clube Atlético de Campo de Ourique, sagrar-se-ia ainda três vezes vice-campeão nacional e conquistaria o Troféu Teresa Herrera, precursor da Taça dos Campeões Europeus, agora Liga Europeia.
O CACO é um dos 12 campeões nacionais do Hóquei em Patins português.
Na década de 70, o histórico clube de Lisboa, de um bairro elitista e pouco virado para o desporto, entrou numa espiral descendente. Num derradeiro suspiro no escalão maior, “caiu” na II Divisão em 1989 e tarda em regressar.
Em curso, liderado por Luís Nascimento, o Projecto 2022 – do ano em que se celebra o centenário - aposta na reafirmação do clube e no regresso aos grandes palcos da modalidade, mas o percurso não se adivinha fácil. Com uma equipa muito jovem, o CACO é último na Zona Sul da II Divisão e a descida, nestes que têm sido anos de sobe-e-desce, é, mais uma vez, uma inevitabilidade. A equipa que desde a 11ª jornada é orientada por Nuno Henriques soma “apenas” três vitórias, todas no Pavilhão Carlos Bernardino, em 21 jogos.
Mas esta sexta-feira, deixando para trás as agruras do Campeonato, o tempo é de Taça de Portugal. E com jogo grande, com um dos rivais maiores de outros tempos, o Benfica, num dérbi com muita história na cidade de Lisboa.
CACO e Benfica defrontam-se a partir das 21h em jogo a contar para os oitavos-de-final da prova rainha, já com a Juventude de Viana à espera de adversário nos “quartos”. O jogo, que será arbitrado por António Santos e Paulo Almeida, será o mais importante da carreira para muitos dos jogadores que integram o plantel sénior da equipa de Campo de Ourique, com sobejos motivos para ser considerado “especial”.
Para chegar a esta fase da prova, o CACO venceu o Grândola por 4-2 e o Lavra por 3-4. O Benfica venceu o Sporting de Torres por 0-9.
Para o treinador Nuno Henriques, que aos 33 anos tem toda a confiança do director Luís Nascimento – que já apostara no técnico na Associação de Patinagem de Lisboa -, esta partida será um desafio táctico, frente a um Alejandro Dominguez que considera inovador, e particularmente motivador por ser uns oitavos-de-final da Taça, mais do que ser frente ao Benfica. É para ganhar, mesmo que na baliza adversária possa estar o irmão, Pedro Henriques.
Com um ano nas camadas jovens do Benfica, num percurso como técnico pelos escalões de formação, Nuno Henriques não esconde – e assume – alguma “mea culpa” na temporada do CACO, mas mostra-se orgulhoso do que foi conseguido a nível de maturação de uma equipa muito jovem.
Nessa equipa pautada pela juventude, o capitão Hugo Nascimento consegue, ainda na casa dos 20, ser o mais experiente.
Hugo já foi campeão nacional pelo Benfica. De Sub-17, em 2006. Ao lado de, por exemplo, Diogo Rafael e Pedro Henriques, que agora reencontra, o que ainda torna este jogo mais especial.
O grupo é de estudantes ou de quem entrou há pouco tempo no mercado de trabalho, e enfrenta testes à paixão por este desporto todos os dias, com treinos fora de horas e o desafio de conciliar tudo… sem remuneração.
A equipa sénior do CACO treina por regra depois das 22h, dado que o pavilhão Carlos Bernardino, de uma localização privilegiada, está ocupado pelos escalões de formação… do Benfica, “empurrados” para fora da Luz por falta de horas disponíveis.
Hugo tem um jeito descontraído, brincalhão, o que também ajuda a superar as dificuldades do dia-a-dia. O CACO é um clube de Bairro, longe do poderio do Benfica, mas com um património histórico e humano imensurável. E o capitão não esquece a Tia Ermelinda, figura icónica do bar do pavilhão, recentemente falecida, ou o senhor Fernando, que faz de tudo um pouco ao serviço do clube.
Há apenas uma semana, Hugo Nascimento defrontou outro Benfica. Aquele que é hegemónico nas competições femininas.
O capitão dos seniores masculinos é o treinador dos seniores femininos e tem protagonizado um excelente trabalho à frente de uma equipa que disputa o Campeonato Nacional. A derrota, quase uma inevitabilidade frente à equipa feminina do Benfica, por 3-7 esconde nos números uma exibição que manteve a incerteza até aos últimos 10 minutos. Aí, o desgaste físico falou mais alto.
Agora, em masculinos, o clube do Bairro vai tentar bater o pé a um dos gigantes mundiais. Por mais uma página na história.
Sexta-feira, 12 de Abril de 2019, 12h11