Regulamentos e a vã glória de os ler
Pedro Alves dos Santos
Encontrados os apurados para a 2ª fase de qualificação da Champions, publicámos uma constituição dos potes a sorteio que não se verificou. Inocentemente, ainda acreditamos em contos de fada, em ficções, como os regulamentos do Hóquei em Patins.
Fechada a 1ª fase de qualificação da Liga dos Campeões com a definição das oito equipas apuradas para a 2ª fase, o HóqueiPT quis acrescentar, anunciando desde logo a constituição dos potes a sorteio.
Não sendo uma "relação positiva" por convicção de não escrevermos o que outros ditam, tivemos a "ideia", confirmada como estapafúrdia semana após semana a nível de várias instâncias, de consultar os regulamentos publicados. Afinal, há obras que nos levam a conhecer sítios e pessoas imaginárias, mas os regulamentos deveriam ser uma inequívoca verdade. Se estão bem ou estão mal, será outra história, mas são os que há para que as competições não sejam uma total anarquia. Em Portugal, na Europa e no Mundo.
Após o sorteio, não faltaram contactos a questionar os potes a sorteio, diferentes dos que anunciámos. Estamos longe de estar imunes ao erro e, para nós, é sempre gratificante receber reparos. É a forma mais taxativa de sabermos que somos lidos, que somos considerados. E espicaça-nos o brio para fazermos melhor, para procurarmos minorar as nossas falhas. Desta vez, assumimos um "salto de fé", uma inocência que, ao fim de tantos anos de mais do mesmo, nos envergonha.
No passatempo de interpretar regulamentos tantas vezes macarrónicos, que os próprios dirigentes que os redigem desdizem ou citam ao sabor do "bom-senso" ou da "letra de lei" conforme convém, foi de louvar o aparecimento de um "rulebook" ("livro de regras", em tradução literal) para as competições europeias em 2022. Um documento simples, de fácil interpretação, um hino à transparência quando a falta desta é a maior pecha de uma modalidade gerida e decidida num círculo fechado, quase sempre a esquivar-se dos olhares críticos do grande público.
O "rulebook" foi revisto e republicado em Julho de 2023. Mas, como numa obra de ficção, qualquer semelhança na modalidade com factos reais dos regulamentos acaba por ser pura coincidência.
Esta segunda-feira, houve dois sorteios promovidos pela World Skate Europe.
Para a ronda de qualificação da Taça WSE, houve a surpresa de um Uttigen que apareceu à última da hora, não constando nos inscritos anunciados 24h antes do sorteio. Desconhecendo-se se outras equipas tiveram oportunidade de se inscrever tardiamente, é impossível não saudar o aparecimento de mais equipas ainda que haja (acreditemos) prazos definidos.
No entanto, com 16 equipas diz o regulamento (bem ou mal) que, de 15 a 17 equipas, deviam ser formados cinco grupos. Mas foram formados quatro. Também não está previsto nenhum constrangimento pelo ranking, mas - ei, porque não? - as equipas foram separadas por pote conforme a sua prestação nas últimas temporadas europeias.
Já para a Liga dos Campeões, está efectivamente previsto o alinhamento das equipas a sorteio por potes para a 2ª fase de qualificação.
Em jeito de enquadramento, o "rulebook" da WSE Champions League tem 25 páginas. Nove são separadores, uma o índice e outro uma lista de contactos. Sobram 14 páginas para ler. Cinco páginas são sobre as exigências aos anfitriões de cada fase concentrada. Quatro páginas são sobre obrigações financeiras dos organizadores. Sobram cinco páginas. Para a 2ª fase de qualificação, há apenas uma página. E, mesmo assim, a mesma entidade que a escreveu e publicou, não a conseguiu fazer cumprir.
"The eight clubs automatically qualified for the WSE Champions League Second Qualifying Round will constitute two (2) pots, according to their ranking. The eight clubs qualified through the First Qualifying Round will constitute two pots, according to their ranking.", lê-se no "rulebook".
Não nos custará admitir que, para o anúncio dos potes, confiámos no inglês que retivemos do ensino preparatório e secundário. Mas poderíamos ter ido ao Tradutor da Google, que faz traduções para português.
Perdoando-se algum português do Brasil e que ranking seja traduzido para classificação, o Google confirma as nossas suspeitas. "Os oito clubes classificados automaticamente para a Segunda Rodada de Qualificação da WSE Champions League constituirão dois (2) potes, de acordo com sua classificação. Os oito clubes classificados através da Primeira Ronda de Qualificação constituirão dois potes, de acordo com a sua classificação."
Simples. Ou não. As 16 equipas a sorteio foram consideradas como um todo e constituídos quatro potes em função do seu ranking, independentemente de terem sido apuradas directamente ou na 1ª fase de qualificação.
Na arbitrariedade do sorteio, a sorte terá sorrido mais ao Porto, que apanha três equipas vindas da 1ª fase de qualificação. Poderá talvez queixar-se mais o Valongo, com um Noia que seria do mesmo Pote 1, mas com potes diferentes, as equipas poderiam ter mais ou menos sorte na subjectividade do desporto. Já o regulamento não devia ser subjectivo.
Para alguns, estas linhas serão apenas uma desculpa de "mau pagador" para um erro de "chicos-espertos", "ruído" que não interessa. No que verdadeiramente interessa, constituídos os grupos desta 2ª fase de qualificação, há jogos de 3 a 5 de Novembro e apuram-se os dois mais bem classificados de cada grupo para a pomposa fase de grupos.
Bem, talvez.
Não se sabe.
Afinal, isso é apenas o que está no regulamento.
Pedro Alves dos Santos
Terça-feira, 17 de Outubro de 2023, 17h09