Fórmula para uma hegemonia

Carlos Esteves

Em 1995, o Barcelona recrutou treinador e dois jogadores ao Igualada para, com a devida paciência, ter uma das mais sólidas hegemonias da História. Funcionará a 'fórmula' no Benfica, num Hóquei em Patins mais competitivo?

Fórmula para uma hegemonia
Foto de capa: Mundo Deportivo

Em 1995, o Barcelona completava 10 anos sem ser campeão europeu depois de ter conquistado a mais importante prova europeia e do Mundo oito vezes seguidas.

Nesse período de “seca”, as equipas portuguesas ganhariam três títulos (dois do Porto e um do Óquei de Barcelos). O Liceo vencera três, no melhor período da sua História, e o Noia um. O Igualada sagrava-se tricampeão europeu depois do Barcelona ter sido humilhado no Pavilhão da Luz, nos quartos-de-final, com uma derrota por 8-1 na segunda mão após uma vitória no Palau por 5-0.

Então, nesse Verão, os dirigentes do Barcelona decidiram ir ao Igualada, que dominava o Hóquei em Patins espanhol e europeu, impor a sua maior capacidade financeira para ir buscar aquele que na altura era considerado o melhor treinador do Mundo, Carlos Figueroa, que vencera três Taça das Campeões Europeus, três Ligas espanholas, duas Taças do Rei, uma Supertaça de Espanha e duas Taças Continentais ao serviço dos “arlequins”.

Chegados em 1995, Carlos Figueroa ficou 10 anos à frente do Barcelona e Folguera e Gabaldón representaram os blaugrana em oito temporadas.
Chegados em 1995, Carlos Figueroa ficou 10 anos à frente do Barcelona e Folguera e Gabaldón representaram os blaugrana em oito temporadas.

Além do treinador, os “blaugrana” chamaram aquele que para muitos era – e, para muitos, não deixou de ser – o melhor guarda-redes do Mundo, Carles Folguera, pesadelo para muitos adeptos das equipas contrárias, entre os quais os benfiquistas, a quem “roubou” dois títulos europeus com exibições do outro Mundo.

E o Barcelona não se ficava por aí. Além de Figueroa e Folguera, mudou-se para o Palau Blaugrana um dos melhores defesas do Mundo, David Gabaldón, que formava com Santi Carda e Folguera uma defesa impenetrável para os atacantes adversários.

Aquele Verão quente de 1995, com trocas de acusações entre o presidente do Igualada e o director desportivo do Barcelona e com Gabaldón a pagar a sua rescisão para rumar aos blaugrana, mudaria a história do Hóquei em Patins espanhol e europeu.

Os primeiros anos de Figueroa não foram fáceis. Demorou a alcançar a hegemonia total. Logo na primeira temporada, o Barcelona voltaria a ganhar a Liga espanhola, 11 anos depois, mas, na Taça dos Campeões Europeus, perderia em casa na segunda mão da final, perante um Igualada que conseguiria o quarto título europeu consecutivo.

Na temporada seguinte, 1996/97, o Barcelona voltava enfim a ser campeão europeu, 12 anos depois, já no novo formato e com a designação de Liga Europeia.

Numa Final Four jogada no Palau Blaugrana, o Barcelona derrotava finalmente o Igualada, por 3-2, nas meias-finais e, na final, triunfaria frente ao Porto na decisão por grandes penalidades. No entanto, internamente o Barcelona não conseguiu revalidar o título espanhol, porque o Igualada, “besta negra” do Barça, sagrar-se-ia campeão pela quinta vez.

Quinta e última vez do Igualada até aos dias de hoje.

O Barcelona de 2000/01, um dos mais dominadores da História, em plena hegemonia na Espanha e na Europa.
O Barcelona de 2000/01, um dos mais dominadores da História, em plena hegemonia na Espanha e na Europa.

O Barcelona arrancaria para a conquista de oito campeonatos nacionais seguidos com Carlos Figueroa, e só pararia na tentativa do 14º, com o Reus de Alejandro Dominguez a interromper a histórica série.

Já na Liga Europeia, em 1997/98, o Igualada seria novamente a “besta negra” dos “blaugrana”. Na Final Four, em Vercelli, o Igualada humilhava o Barcelona por 8-1 na meia-final, vencendo depois a equipa da casa para o seu quinto título de campeão europeu.

Na época seguinte, o Barcelona de Figueroa apontava mais uma vez ao título europeu, mas a Final Four seria na casa do seu maior rival na altura, o Igualada, e, em novo embate nas meias-finais, houve nova vitória dos arlequins, por 3-1. Em Les Comes, o Igualada seria campeão europeu pela sexta vez em sete anos, derrotando o Porto na final.

O Igualada conseguia ganhar três Ligas Europeias em quatro anos já sem Figueroa, Folguera e Gabaldón. Um dos maiores feitos da modalidade.

Mas o período hegemónico dourado e histórico do Igualada, com a conquista de cinco campeonatos espanhóis e seis provas máximas europeias, chegava ao fim. E começava a hegemonia europeia do Barcelona de Figueroa, ganhando cinco Ligas Europeias em seis anos até à saída do técnico em finais de 2005, em divergência com o presidente do clube.

Carlos Figueroa saiu do Barcelona com nove campeonatos espanhóis e seis Ligas Europeias conquistadas em 10 épocas, deixando o Barcelona dominador em Espanha e na Europa.

Regresso (natural) de João Rodrigues reforçou aposta em
Regresso (natural) de João Rodrigues reforçou aposta em "gent blaugrana". Lucas Ordoñez, Pol Manrubia e Nil Roca ficam. Para além de João, chegam Pau Bargalló e a equipa técnica liderada por Edu Castro.

As hegemonias não são fáceis de conquistar e não são imediatas.

Agora, é o Benfica que, para a época 2024/25, 29 anos depois, faz uma tripla aposta semelhante, tentando conseguir a hegemonia nacional e europeia na modalidade.

Pau Bargalló, para muitos o melhor jogador do Mundo, sai do Barcelona e da OK Liga para vir reforçar as águias e provar, na melhor liga do Mundo, que é mesmo o melhor do planeta a jogar a modalidade.

Com Pau, vem o melhor avançado a finalizar “de primeira” do Mundo, aquele que mais golos marca com as suas assistências, João Rodrigues. Regressa a “casa”, depois de há seis anos ter partido para Barcelona.

E com os dois jogadores vem um dos melhores treinadores da actualidade: Edu Castro, 57 anos, um estudioso da modalidade e da poesia de Fernando Pessoa.

Edu Castro sai do Barcelona após sete anos, com a conquista de uma Liga Europeia, uma Taça Continental, duas Taças Intercontinentais, seis Ligas Espanholas, quatro Taças de Espanha e três Supertaças.

O treinador vai agora enfrentar um novo campeonato, outro estilo de Hóquei, com a necessidade de ganhar no imediato face à aposta realizada por parte do Benfica. Talvez por isso, se justifique também a chegada com Edu de Jordi Roca, adjunto, e o preparador físico, Daniel Fernández, numa mudança conjunta da equipa técnica do Barcelona.

A permanência de Nil Roca e Lucas Ordoñez, que já trabalharam com Edu Castro, tal como Pol Manrubia, nos tempos da formação do Barcelona, a juntar à chegada de Pau Bargalló e João Rodrigues, dá ao técnico uma base sólida para o arranque de época, com metade do plantel já conhecedor das suas ideias de jogo.

Será Edu Castro capaz de conseguir “pôr a render” os jogadores mais jovens do Benfica (Pol Manrubia, Zé Miranda, Viti ou Martim Costa), correspondendo ao potencial que é esperados deles como fez com Nil Roca, Ignacio Alabart ou, esta época, Eloi Cervera?

O Benfica não é campeão europeu desde 2016. E não tem uma hegemonia nacional desde o princípio dos anos 90, quando ganhou cinco campeonatos em sete anos.

Conseguirá o Benfica, com a chegada de Edu Castro, Pau Bargalló e João Rodrigues, alcançar essa hegemonia no competitivo campeonato português? Terão os dirigentes e adeptos do Benfica a paciência de esperar alguns anos para alcançar essa hegemonia, como tiveram dirigentes e adeptos do Barcelona na chegada de Figueroa, Folguera e Gabaldón?

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